quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Luso

Portugal que sempre ouvi falar
De terras e aldeias que iludiram minha infância
Na verdade participei de suas guerras não históricas, mas pessoais
Tenho sangue de colonizador
Tenho sangue de colonizado
Fico no Brasil e me crio
Não quero mudar meu escudo
Que é meio pouco e muito criativo

Portugal que me trouxe o gosto literário
Roubou-me a carta de alforria
Deu-me a melancolia, o passo mais arraigado

Lugares que não conheci, convive somente
Entre fados e fatos
Tentei buscar em mim o meu canto
Todo canto é menor do que a vida de qualquer pessoa
É registro apenas
Mas, não para o português

E da África vieram os colares
As essências sempre presentes

E no Brasil cá estou
E não me mudo porque é nele que sou filho
De uma mãe distante
De um pai guerreiro

Henrique Pires

domingo, 13 de setembro de 2009

Poema Frase

O dia começa com pão com manteiga. Café pingado três vezes. Uma sacudida forte e benção pra tudo ocorrer bem. Começa no maquinal e surpreendente “Bom Dia” ora sussurrado, ora declamado. Nenhum dia começa na pia cara lavada. Ele vem depois de algumas bocejadas e baforadas. Todo dia começa no abrir os olhos mesmo que seja no sentido mais limitado disso. O sol que vem ou se ausenta. As persianas que se desfolham. O ruído dos tacos. O choque dos calcanhares. A celebração ou desprezo a mesa. O gesto de abrir. O gesto de fechar. Os três passos quase que tateados ao despertador. A ida ao banho. A volta pra buscar o esquecido. O dia começa na estúpida concretização dessas ações, na terna intenção de cobri-las de novidades, esperanças. Começa outra guerra, outro encontro com o desconhecido, outra maravilhosa oportunidade de amar. O dia começa até mesmo antes de começar - assim escrevendo uma poesia as duas e trinta e seis da manhã. É alvorada, prelúdio, nosso canal com o mundo.

Henrique Pires

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Simples desejo

Dedicado a quem me possibilitu a vida - Maria Ermelinda

Sensualidade pouca e vazia
Que se mistura nos tijolos
E nas mãos de tantas mães

Essas esperam um não sei o quê
Nem pra quê
Nem tem por quê contradizer
Basta dizer que é mãe e mais nada

Seus filhos soletrados aos beros
Carentes de tudo e ao mesmo tempo fartos de sí mesmos
Já são sábios com pouca idade
E a malícia é a maldade de quem vê

Sempre vamos ao encontra da escola
Seja qual for sua arquitetura
Pobre ou noturna esperamos à porta

As mães de lábios mansos e afrouxados
São firmes na decisão da vida
Afloram quase sempre na despedida
E no fundo são quase mudas

Sensualidade pouca e tardia
A entrega mártire de um Amor incondicional
Nem todas são heroínas
Mas todas podem voar
E quando fazem não voltam mais

Seus filhos soletrados ao vazio
Escapam, esperneam e acostumam-se
a permanecer sós na presença de outros tantos mais

Então tiveste mãe?
Ou ela que te teve no seio farto dos dias?
Beber o leite e alegrar as fotos
Agora são lembranças findas de minha mãe Maria

Henrique Pires

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Aquela Negra

Vi aquela negra nua
Boca vermelha
Brincos argolados
Cabelos armados

Tinha o rosto virado
Envaidecido pela idade
Cor de destaque
Ornando no ambiente pálido

Aparentava entre trinta e trinta e cinco
Não sabia dizer o que fazia
Se examinava ou fitava os transeuntes que passavam

Era estupidamente bela e negra
Toda harmonia nas pontas dos seus seios
Que saltavam aos olhos
E animavam outros pontos

Não era vulgar
Tampouco vaidosa
Era natural
E esse natural transbordava, embriagava, entorpecia todos nós

Aquela negra carregava no ventre um filho
Que não significava retrato de miséria, pois nada pedia
Era o contrário – vida brotando no espaço ondulado do seu corpo

Não pude beijar aqueles lábios
Aprofundar minhas mãos no espaço que em V se finalizava
Aquela negra se respeitava
Como mulher, mãe, criação

Aquela negra poderia ser qualquer outra
Residente de qualquer cidade, estado ou país
O que as tornam irmanadas não são suas afro-descendências

E sim na decência de ser negra e mais nada



Henrique Pires

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Confusão de tons

O amarelo é verde
O verde é branco
O branco é cor-de-rosa
O cor-de-rosa é a mistura do azul com o preto
O azul inexiste sem o preto
O contrário não é válido

As cores fazem cartazes
Bolhas de sabão
Sabão lavam as mãos, mas não a alma

A aquarela muito diluída - destoa
Sem tom perdemos a fala
E se falamos muito é porque não observamos as cores

O vermelho é assim vergonhoso
O bege extravagante. quase indecente
Cada um faz suas concepções
E nas ações temos tintas perdidas

Pinto de laranja a ponte rachada de Outono
Pinto de jasmin a flor turquesa

O branco morreu na paz
O preto na guerra
O amarelo no sol tardio

Aquarela,
Ela,
A inovar e nos deixar as cores da esperança que gira, gira, sempre gira

Henrique Pires

sábado, 13 de junho de 2009

Frase Poema

“E essas mães que estão sempre a pedir. E pedem, e pedem, e pedem sem cessar. Eu a caminhar e a escutar esse pedido repetido sempre”.

Henrique Pires

Made in Brazil

Minha índia não é ingênua,
Não sabe o segredo da jurema,
É uma nativa carnuda e com uma sexualidade exuberante,
Que deixa qualquer homem de boca aberta
Têm muitos amores,
Amantes
É genuinamente brasileira
Usa colar de coco e brincos de prata,
Toma coca-cola e já fez até uma home page,
Não desperdiça maquilagem para ficar mais sexual,
É multifacetada
Sua oca é uma cobertura na Barra da Tijuca
Com ela não têm tempo ruim,
Não sabe a dança da chuva, mas, tem um samba no pé que estremece qualquer Sapucaí!
Essa índia é um tesão,
Poderosa,
Mema, é seu profile no orkut
Mas seu nome mesmo é Iracema da Conceição


Henrique Pires

sábado, 14 de março de 2009

Drummond sempre eterno

Drummond sempre eterno te vejo
Sempre a espera da palavra
Esta cálida, lida ao desejo
E em seus sentidos, decifrada

Drummond poeta-menino
De alcances inimagináveis
Nasceu do aço de Itabira
E reside agora na pouca casa

Drummond presente te sinto
Na percepção das imagens
Desse, de outro tempo
Tão igual, tão honesto ao passado

Drummond sempre eterno te sigo
Em vão não posso copiar-te
És único poeta que sorri
Assim sem mais alarde

Drummond se fosse menos magnífico
Poderia eu e tantos outros poetas
Na curva do tempo calar-te

Henrique Pires

quarta-feira, 11 de março de 2009

Interrogações

O que somos? Verdades? Mentiras? Contradições? Somos muitos? Somos poucos? Livres? Presos? Indecisos? Arbitrários? O que vale a nossa vida? Viver? Morrer? Festejar, talvez? O que queremos? Roupas? Dinheiro? Alegrias? Saudades? E o amor, virá? Paixões? Loucuras? Equilíbrio? O que fazemos? Onde está nossa alma? Ouvimos? Entendemos? E fazemos?

O que vem depois? O progresso? A evolução? Regressão nas ações? A ambição tecnológica se chegue e nos cega? A banalidade é tão ruim? E a especialidade é tão boa? E os crimes? Quem irá catalogar os Deuses todos? Quem poderá sentir o perfume que nos entorpece? E nos entorpecemos?

O que escrever? Nada? Tudo? Difícil? Fácil? O que tem mais valor? Podemos viver sem amanhecer? E se anoitecêssemos? Tempo? Invenção? Transcende nos lábios a pouca verdade sem interrogação. Chegamos a algum ponto. Disperso. Só. Se olhar com atenção poderá discorrer sobre algo. Filosofar? Ser ou não ser? Que seja gratuito. Honesto. Estamos aqui, ali, acolá a procurar nossa identidade que se perde, esvazia, dissolve-se.

Tanta interrogação não servirá pra nada se não buscamos respostas. Estas não são necessariamente verdades absolutas e sim um nosso olhar sobre o mundo. Sobre nós mesmos. O medo pode corroer, a saudade sufocar, mas a (in)definição é o maior mal. Toda pornografia é agressiva porque no fundo ela é o que é, sem maquiagens, sem se salvar no meio de tudo. Não seja pornográfico, mas seja sim tua verdade. Defendida, honrada todos os dias. No fim não será o mais perfeito, mas será uma pessoa e não uma mera personagem.


Henrique Pires

domingo, 8 de março de 2009

KD VC TÁ "OFF" PQ

Queremos fazer tudo ao mesmo tempo. Conectados. A internet nos faz heróis. Mas, o que você queria mesmo era ser um grande vilão. Fotos. Blogs. Confissões. Amizades virtuais. Quer-me no orkut, entre seus contatos. Não me ligue, mande uma mensagem, é mais fácil, rápido. Queremos mostrar o que nos falta. Queremos submeter nossa vida a milhões de curiosos. Pesquisamos. Estamos em sintonia ouvindo nosso som. Baixa daqui. Posta dali. E agora, desligou a televisão?
Queremos uma saída sadia pra essa vida vazia. Não posso te tocar. Podemos nos ver, liga a webcam aí. Digita no google a palavra “saudade” e vê o que aparece. Aparece lá na faculdade e manda um e-mail pra mim. Abro o msn e kd vc tá “offpq. Queremos fazer tudo ao mesmo tempo. Conectados. Distanciados pelo que nos aproxima. Essa é a tecnologia. A era da comunicação. Abram suas gargantas e gritem. Quem sabe alguém que não tenha um mp qualquer no ouvido possa te escutar. Fecho a janela, desligo e agora por mais uma noite posso eu “desplugar”.

Henrique Pires