quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Simples desejo

Dedicado a quem me possibilitu a vida - Maria Ermelinda

Sensualidade pouca e vazia
Que se mistura nos tijolos
E nas mãos de tantas mães

Essas esperam um não sei o quê
Nem pra quê
Nem tem por quê contradizer
Basta dizer que é mãe e mais nada

Seus filhos soletrados aos beros
Carentes de tudo e ao mesmo tempo fartos de sí mesmos
Já são sábios com pouca idade
E a malícia é a maldade de quem vê

Sempre vamos ao encontra da escola
Seja qual for sua arquitetura
Pobre ou noturna esperamos à porta

As mães de lábios mansos e afrouxados
São firmes na decisão da vida
Afloram quase sempre na despedida
E no fundo são quase mudas

Sensualidade pouca e tardia
A entrega mártire de um Amor incondicional
Nem todas são heroínas
Mas todas podem voar
E quando fazem não voltam mais

Seus filhos soletrados ao vazio
Escapam, esperneam e acostumam-se
a permanecer sós na presença de outros tantos mais

Então tiveste mãe?
Ou ela que te teve no seio farto dos dias?
Beber o leite e alegrar as fotos
Agora são lembranças findas de minha mãe Maria

Henrique Pires

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Aquela Negra

Vi aquela negra nua
Boca vermelha
Brincos argolados
Cabelos armados

Tinha o rosto virado
Envaidecido pela idade
Cor de destaque
Ornando no ambiente pálido

Aparentava entre trinta e trinta e cinco
Não sabia dizer o que fazia
Se examinava ou fitava os transeuntes que passavam

Era estupidamente bela e negra
Toda harmonia nas pontas dos seus seios
Que saltavam aos olhos
E animavam outros pontos

Não era vulgar
Tampouco vaidosa
Era natural
E esse natural transbordava, embriagava, entorpecia todos nós

Aquela negra carregava no ventre um filho
Que não significava retrato de miséria, pois nada pedia
Era o contrário – vida brotando no espaço ondulado do seu corpo

Não pude beijar aqueles lábios
Aprofundar minhas mãos no espaço que em V se finalizava
Aquela negra se respeitava
Como mulher, mãe, criação

Aquela negra poderia ser qualquer outra
Residente de qualquer cidade, estado ou país
O que as tornam irmanadas não são suas afro-descendências

E sim na decência de ser negra e mais nada



Henrique Pires

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Confusão de tons

O amarelo é verde
O verde é branco
O branco é cor-de-rosa
O cor-de-rosa é a mistura do azul com o preto
O azul inexiste sem o preto
O contrário não é válido

As cores fazem cartazes
Bolhas de sabão
Sabão lavam as mãos, mas não a alma

A aquarela muito diluída - destoa
Sem tom perdemos a fala
E se falamos muito é porque não observamos as cores

O vermelho é assim vergonhoso
O bege extravagante. quase indecente
Cada um faz suas concepções
E nas ações temos tintas perdidas

Pinto de laranja a ponte rachada de Outono
Pinto de jasmin a flor turquesa

O branco morreu na paz
O preto na guerra
O amarelo no sol tardio

Aquarela,
Ela,
A inovar e nos deixar as cores da esperança que gira, gira, sempre gira

Henrique Pires